Como o Titanic: Orquestra do Líbano continua a tocar enquanto o país se afunda

A Orquestra Sinfónica Nacional do Líbano viu a maioria dos seus músicos abandonarem a banda (e o país), devido à crise económica.

Enquanto a orquestra nacional do Líbano se preparava para o concerto de abertura de temporada, com a ausência de metade dos seus músicos, o maestro Lubnan Baalbaki enfrentava um dilema: tentar tocar a peça completa ou preparar uma versão mais pequena.

No dia do concerto, três músicos extra apareceram, enfrentando as pressões de uma crise económica que levou dezenas dos seus colegas a abandonar a banda, e Baalbaki foi capaz de conduzir a partitura original.

Senti que era o momento em que o Titanic se estava a afundar e [a banda] insistiu em manter a música a tocar, apesar de tudo o que estava a acontecer”, disse Baalbaki, em declarações à Reuters.

Mas não se sabe por quanto mais tempo a banda conseguirá manter-se à tona.

A Orquestra Sinfónica Nacional do Líbano não foi poupada aos efeitos da crise económica — exacerbada pela pandemia de covid-19 e pela explosão de Beirute em 2020, que matou mais de 215 pessoas e danificou várias partes da cidade, incluindo o conservatório onde a orquestra ensaia.

Quando a moeda caiu, os cerca de 100 músicos do conjunto assistiram à queda do valor dos seus salários de $3.000 para cerca de $200, o que levou a maioria dos estrangeiros a fazer as malas e ir embora.

“Costumávamos fazer produções muito grandes que cobriam todo o repertório clássico. Agora é muito difícil”, disse Baalbaki.

Os salários dos que permanecem cobrem agora pouco mais do que o combustível que gastam para se dirigirem aos ensaios, obrigando Baalbaki a reduzir o número de concertos de dezenas para meia dúzia por ano.

Isto espelha um declínio mais amplo nos espaços culturais do Líbano, incluindo os festivais de verão, outrora vistos como um farol das artes na região.

Mona Kusta Semaan, uma violinista que está na orquestra desde a sua refundação em 2000, após o encerramento durante a Guerra Civil do Líbano entre 1975 e 1990, tem boas memórias dos tempos em que atuava com o tenor espanhol Plácido Domingo nas ruínas romanas em Baalbeck, no início dos anos 2000.

“Espero agora que as coisas melhorem e que o Líbano se restabeleça, e que [os músicos estrangeiros] voltem”, disse.

Mesmo antes da crise, o conservatório tinha estado parado durante quase uma década pelo sistema sectário de partilha de quotas do Líbano, em que os lugares de topo nas instituições públicas são distribuídos entre políticos que geralmente nomeiam lealistas, com pouca consideração pelo mérito.

Quando o chefe do conservatório Walid Gholmieh, um cristão ortodoxo grego, morreu em 2011, não foi encontrado um substituto permanente durante sete anos. Em vez disso, foram nomeados dois chefes interinos.

O primeiro era um burocrata sem qualificações musicais. O segundo, visto como qualificado para o cargo, não foi nomeado permanentemente porque era católico e não um cristão ortodoxo.

O músico libanês Bassam Saba assumiu finalmente o cargo em 2018 depois de regressar dos Estados Unidos, mas morreu devido a complicações relacionadas com a covid-19 no ano passado. Baalbaki receia agora que possa voltar a demorar anos até que um sucessor seja nomeado.

“Somos reféns”, disse Baalbaki. “O destino da arte e da música no Líbano é feito refém neste país por causa da classe política que insiste em introduzir este espírito intolerante”, continuou.

“Nascemos neste país e este é o nosso destino: encontrar soluções e criar novas oportunidades”, concluiu.

ZAP //



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